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quinta-feira, 12 de março de 2009

Moralização: uma bandeira para o próximo presidente do Brasil

VIDEO DA INVASÃO: http://oglobo.globo.com/pais/video/2009/10926/

Enquanto acompanhava pela internet a invasão do edifício do ministério da agricultura em Brasília, por 400 mulheres militantes do movimento Via Campesina - episódio fartamente divulgado pela grande imprensa - ocorreu-me comentar aqui o que tenho observado sobre questões que penso serem as que mais sensibilizam o eleitorado brasileiro, no momento em que o país se prepara para substituir o presidente Lula. Do meio rural às metrópoles, a violência se apresenta como o problema mais abrangente, capaz de unificar o discurso entre as diferentes classes sociais, quer pela direita, quer pela esquerda. É a característica negativa que mais chama a atenção sobre o país, visto do exterior. A violência polariza ricos e pobres como vítimas, com exceção para algumas divergências quanto aos métodos de combate. Portanto, as causas que mais irão influenciar as tendências e marcar as diferenças no debate eleitoral e mesmo determinar a manutenção ou não da presidência da república com o PT (Partido dos Trabalhadores), a partir do próximo pleito, no meu ver serão, no meio rural a definição da Reforma Agrária, e no meio urbano, o combate à corrupção.

A moralização do Brasil, como bandeira política, aparece ainda isolada em atitudes mais afoitas, como a da entrevista do Senador Jarbas Vasconcelos, aliás com impacto de fazer inveja a qualquer campanha eleitoral da esquerda, mas fraquejando para o desinteresse pelas coisas da política. Começam a surgir entretanto pelo país, movimentos de reflexão e vigilância sobre a atuação dos poderes, inclusive sobre o comportamento da justiça. Merecem ser observados, entre outros no mesmo contexto, o crescimento das proposições do grupo Via Campesina e a expansão de um movimento surgido em Brasília, de sigla MOJUS (Movimento de Olho na Justiça) que se dirige para norte e cria delegação em Belém, Pará, animados ainda pelos efeitos do Fórum Social Mundial 2009 e pela adesão de instituições políticas regionais. Iniciativas desse tipo soam como alertas e podem ser um filtro ao ingresso de corruptos nos partidos e nas instituições governamentais e legislativas a partir de agora. Mas é preciso arrepiar carreira com a corrupção entranhada no cotidiano das pessoas e dos seus representantes.

Os números da popularidade de Lula e a estabilidade no quadro da candidatura petista à sucessão, demonstram que, nem os partidos de tendência neoliberal – que receiam lançar mão dos seus melhores nomes para não queimar cartucho numa eleição perigosa - nem os partidos que se organizaram à esquerda do PT, atinaram ainda com uma fórmula capaz de abalar a tendência que dá vitória para a pré-candidata Dilma, apoiada pelo presidente. De ambos os lados, as oposições cometem erros crassos e anti-voto, como o de criticar a bolsa-família, um benefício assistencialista instrumentalizado para assegurar votos ao PT, mas distribuído entre eleitores que se formaram ouvindo os pais falarem do Brasil como um país onde pessoas morriam à fome e viviam os nervos da hiperinflação. Complicado é se criticar um benefício que existe em quase todos os países desenvolvidos do mundo. Em Portugal, por exemplo, que não é exatamente um país de primeiro mundo, fala-se muito em se rever e aperfeiçoar o Rendimento Social de Inserção, mas ninguém ousa tocar na idéia de o extinguir. O RSI é um rendimento que salva da fome milhares de famílias, e dá-lhes esperança de saírem da dependência do estado, através de programas sociais de aproveitamento produtivo dos beneficiários. É portanto, perda de tempo de quem pensa em derrotar Dilma nas próximas eleições, andar a bater em bolsa-família e outras do género. As oposições, unidas ou divididas como de costume, deveriam centrar o discurso na moralização do país e na prisão em massa para os corruptos.

As manifestações do início da semana no Brasil, um pouco por todo o país mostraram novamente a relação entre o retardamento da Reforma Agrária e a corrupção. Pois se a Reforma Agrária ainda hoje anda às voltas com questões regulamentares e com necessidades de revisão de modelo, como bem apanha o Via Campesina, isto se dá por causa do jogo de interesses que tomou conta do meio político. Nas grandes cidades, sedes das maiores instituições, a corrupção traduz-se em seguidos episódios, em casos escandalosos que surgem nas mais diversas áreas do poder, inclusive do poder judiciário. Os escândalos e a impunidade nos crimes contra o património e o dinheiro público, têm provocado o desgaste das agremiações partidárias e a rejeição pelo poder institucional por parte dos eleitores e até dos políticos de bem. Os combatentes à corrupção ainda não afinaram o tom. O discurso e a responsabilidade pela moralização do país ainda não unificam as oposições, e nem ao PT, este também envolvido em escândalos. Algumas tendências políticas preferem manter-se afastadas da via institucional, no fomento de políticas perfeitas, mas sem urgência de tê-las representadas nas mais altas instâncias. Parte da esquerda sindical brasileira, às vésperas de uma nova eleição presidencial, ainda prefere combater por fora os males do poder, afastar-se dos partidos ou juntar-se aos partidos no discurso para a derrota certa. Não assimilaram ainda que a sociedade civil não governamental, organizada ou desorganizada, tem que ser o “espírito” crítico, a luz da consciência institucional, mas no formato partidário tem que ir ao poder. Partido não é associação, sindicato, ONG. Os partidos são feitos para disputar o poder, ir para o poder. Sem essa perspectiva, a curto prazo, as políticas justas se transformam em bandeiras para um futuro descolado, que não se emenda com a substituição da realidade atual criticada. Evidentemente que os partidos com menor colégio e menos chance de eleger um presidente da república optam pelo crescimento qualitativo, baseados nas propostas das bases, mas erram quando priorizam no seu discurso pré-eleitoral a crítica ao que é menos mal na prática governamental de Lula. O combate à corrupção exige uma vigilância que não deixa espaço para questões secundárias. A agir assim, o discurso da moralização acabará vindo de dentro, provavelmente de áreas isentas do próprio PT, para ajudar o intocável presidente Lula a eleger a sua candidata. Ninguém me encomendou “a missa” ou precisa acreditar nestas observações, mas não custa nada não apagar.

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