.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Que o petróleo nos traga outras "gulbenkians"

A descoberta de mais petróleo no Brasil, que pode colocar o país entre os 10 maiores produtores mundiais, as novas possibilidades de exploração prospectadas em Portugal, os relatórios e comunicados divulgados pelas empresas envolvidas nos consórcios exploratórios, distribuídos pelos dois países e associados entre si, me deram a idéia de visitar alguns sites, a ver a quantas vai o investimento das petrolíferas em uma área que me interessa especificamente, a área cultural. Escolhi a Petrobras, a Galp e a Partex, empresas com fortes ligações com a arte, a cultura, a beneficência e o meio ambiente, no mundo da língua portuguesa. Ainda é cedo para pensarmos o que virá de melhor neste sentido, a partir das novas descobertas de petróleo e gás, em Portugal e no Brasil, mas é hora de ficar de olho nos números. E de começar a exigir mais dessas empresas, tendo em conta que também lideram a economia dos respectivos países em lucros anuais obtidos. As petrolíferas, como os bancos, empresas estatais ou privadas, deveriam ser reguladas em termos de percentagens mínimas de investimento em projectos culturais, educacionais e outros - mecenatos e gastos com patrocínios não incentivados pelo Estado - e de acordo com os lucros exibidos.
A Galp Energia, empresa portuguesa que detém apenas 10% do consórcio Tupi Sul para o BM-S-11 e participa também na exploração de outros blocos petrolíferos na bacia de Santos e de Campos, teve as ações valorizadas em mais de 5% esta semana na bolsa portuguesa, por conta do anúncio da aquisição de sete blocos exploratórios no Brasil, que poderão garantir a Portugal um terço do consumo do país nos próximos 15 a 18 anos. Se as reservas chegarem a oito mil milhões (oito biliões) de barris, ao preço actual (95 dólares o barril), o petróleo brasileiro que caberia à Galp valeria algo em torno de 54,2 mil milhões (bilhões ou biliões) de euros, um terço da riqueza produzida anualmente em Portugal. A Galp Energia é considerada uma grande incentivadora da cultura em Portugal, principalmente com o patrocínio de espectáculos, um nicho com menos prerrogativas de mecenato. Muito embora invista milhares de Euros em publicidade, não divulga no site uma política cultural. Trata-se de uma instituição privada e não tem que o fazer, mas deveria. O site é voltado para acionistas e consumidores, não possui link informativo para o grande público dos espectáculos que patrocina e é totalmente focado nos segmentos de negócio da empresa. O site é chato e não possui nenhuma afinidade com os anúncios comerciais simpáticos feitos para televisão.
A Partex Oil and Gas (Holdings) Corporation, com alguma presença no Brasil, e que em conjunto com a Galp Energia e com a Petrobras prepara-se para explorar petróleo em águas profundas ao largo da costa portuguesa (entre Sintra e Aveiro) pertence totalmente a uma das instituições mais importantes do mundo no âmbito da cultura, a Fundação Gulbenkian. Os interesses desta fundação estão actualmente voltados para quatro áreas: Arte (46%), Beneficência (10%), Ciência (16%) e Educação (28%). É um caso em que o desenvolvimento cultural está directamente ligado à produção e exploração do petróleo, numa relação para além do mecenato. Todos os anos, a Partex contribui com cerca de 40 a 45 milhões de dólares (30,6 milhões de euros) em dividendos para a instituição sedeada em Lisboa - cerca de um terço do orçamento. O arménio Calouste Gulbenkian, liderou em 1912 um consórcio para explorar o petróleo do Iraque, que levou à criação, há 50 anos, de uma fundação, que tem diversificado e inovado, cada vez mais, no mercado das artes e da cultura, e está presente em diversos países. Este ano, por exemplo, participa num projecto internacional, divulgado nos Emirados Árabes, denominado ‘Golden Web’, um grande portal na Internet no qual também estão envolvidos a Emirates Foundation e o British Museum. O Gonden Web vai incentivar a reconstituição das grandes viagens de Marco Pólo, Vasco da Gama e Ibn Battuta, entre outras personagens das descobertas marítimas. Em 2011, a iniciativa irá gerar 12 grandes exposições mundiais, uma delas em Lisboa. Convido-os a visitar o site da Gulbenkian, para conhecer a história e acompanhar as actividades desta instiuição pelo mundo, no http://www.gulbenkian.pt/
A Petrobras colocará o Brasil entre os 10 maiores do mundo em produção de petróleo, lidera o mercado brasileiro, realiza o sonho da auto-suficiência e detém 50% do novo consórcio para explorar petróleo em Portugal, no qual também estão a Galp e a Partex. É sem dúvida uma das empresas brasileiras que mais investe na produção cultural. O site é dinâmico, contém todas as informações possíveis e imagináveis sobre actividades da empresa e links para as outras associadas. Os projectos culturais da Petrobrás, distribuídos pelas regiões do país, assim como o crescimento do percentual investido, em mais de 200% desde o ano 2000, são louváveis. Mas os investimentos na cultura, para além de estarem muito aquém do perfil de lucratividade da empresa, estão expostos num sub-link bem distante da home, difícil de localizar. A Petrobras é lucrativa, investe em projectos culturais também rentáveis, exibe gráficos que lideram de longe o investimento cultural entre empresas privadas e estatais brasileiras, mas poderia investir mais em arte e cultura como actividade lucrativa, considerando o substancial mercado brasileiro das artes. Não apenas como mecena, mas como parceira e fomentadora de projectos NÃO contempláveis pelas leis de incentivo cultural.
O salto brasileiro vertiginoso, em menos de 20 anos, da dependência dos preços internacionais do petróleo para a auto-suficiência, e agora para a entrada no ranking dos grandes produtores, justificaria o surgimento de uma espécie de "gulbenkian" brasileira, já que o Brasil é um celeiro cultural e um sustentáculo para a expansão da língua portuguesa. Os brasileiros podem e devem cobrar isso, pois as actividades desenvolvidas no Brasil pela Petrobras são as principais responsáveis pelo resultado exibido por esta empresa, apesar da presença positiva em 27 países e da abertura à iniciativa privada. A Petrobras lidera os investimentos culturais no Brasil, mas devia investir mais, inclusive para incentivar outras empresas que também já o fazem. A expansão da cultura brasileira e a afirmação da língua portuguesa no mundo devem seguir a evolução dos negócios do petróleo, tanto em Portugal quanto no Brasil.
Ana Lúcia Araújo

Marcadores: , , , , , , ,

0 Comentários:

Postar um comentário

<< Home