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quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O Petróleo é mesmo nosso, e é real

Enquanto no hemisfério Norte todos se preocupam com uma crise do combustível durante o inverno que se aproxima, e os preços do barril de petróleo disparam por conta da desvalorização do dólar, o Brasil exibe a sua performance de auto-suficiência em petróleo, longe do frio de doer nos ossos que impõe gastos absurdos de energia, e dos conflitos políticos que marcam a actualidade do vizinho, a Venezuela. A Petrobras é líder mundial na exploração e produção de petróleo em grande profundidade, no leito do mar. E a bacia de Campos a maior fonte dessa autonomia.

Quem viveu, como eu, a segunda metade da década de 1970, anos de ditadura militar e primeiros anos de descompressão política, dos efeitos dos choques do petróleo na economia brasileira e mundial, e vivieu a nostalgia da campanha vitoriosa O Petróleo é Nosso - que havia unido direita e esquerda em torno da criação da Petrobras - sabe que o Brasil está hoje a viver um sonho. Será que sabe? Dizem que vivido por dentro o sonho é bem real, mas ainda bem. Em 1979, exactamente na altura em que, já iniciada pela esquerda, me engajava no movimento estudantil e, ao mesmo tempo, vivia o dancing days, se alguém me disesse que eu viveria para ver o Brasil auto-suficiente em petróleo, ia dar risada e pensar que esse alguém era um falso profecta do desenvolvimentismo. Embora só tivesse 17 anos, já havia levado muita corrida da "repressão" em passeatas e dissertava bem sobre a crise brasileira. E não me acanhava quando algum exacerbado me xingava de alienada porque eu saia de um ato público directo para uma matiné na discoteca, para disputar medalhas e prêmios em dinheiro nos concursos de dança. A vida era a sério na altura, apesar da abertura que se conquistava aos poucos, mas também era para sonhar. Auto-suficiência em petróleo não, porque era delírio.

Na década de 80, quando a minha militância se misturou com a minha iniciação no jornalismo, iria pensar o mesmo, se alguém me acenasse com essa possibilidade. No início de 1980, quando entrei para a universidade, comecei logo um estágio no jornal A Província do Pará - quarto jornal fundado no Brasil por Assis Chateaubriand, componente dos Diários Associados - e escrevia paralelamente matérias para o Jornal Hora do Povo, que chegava às bancas do país recebido com bombas - acreditem que durante um tempo recorde consegui conciliar essas duas actividades. Nesta altura, as eleições directas, o controle da inflação e da dívida externa, o fim da censura política e a liberdade de expressão, eram ainda bandeiras de luta. A Petrobras já era uma estatal produtiva e de nome sonante, mas, autonomia em petróleo, nem no melhor dos sonhos. Os Anos 90 chegaram, com tudo o que reza a história recente dos brasileiros ainda vivos hoje, e na meia idade, como eu. Inclusive chegaram com o prazer e a gana de elegermos, por voto directo, um Presidente da República, para logo depois experimentarmos mandá-lo embora. O Brasil podia tudo. Mas autonomia em petróleo era apenas uma expectativa, quanto mais no rítmo em que andavam as pesquisas nas universidades brasileiras, quase sem excepção, por falta de verbas e de competência política.

Mas o Brasil mudou, melhorou, só quem é cego não reconhece. E o que não mudou pode ser dito, mostrado e mudado, em alto e bom som. Muitos disparates continuam a ilustrar a política, a economia e a história do Brasil, mas hoje as formas de censura à crítica social e política é que são clandestinas. Minha careira guinou para o nicho da Assessoria de Imprensa e me trouxe para o lado de cá, Portugal, sem nunca eu ter deixado o Brasil totalmente. Viajar entre o Brasil e a Europa é hoje um sonho possível de realizar-se para um número cada vez maior de brasileiros. E o avanço das tecnologias da comunicação multimedia me permitem hoje trabalhar, com desenvoltura, de um lado e outro do Atlântico, inclusive escrever, estando em Portugal, para um jornal editado numa importante cidade do Rio de Janeiro, justamente localizada na zona capital da auto-suficiência em petróleo, Macaé. Um sonho brasileiro e meu, contido numa ficção, hoje uma história bem real que eu vivi para ajudar a escrever.

Ana Lúcia Araújo
num sonho sonhado

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